O IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA GERAÇÃO DE ENERGIA E COMO A IA PODE AJUDAR
- Telma Meneghette Bassan
- 6 de mai.
- 8 min de leitura

Introdução: O cenário das mudanças climáticas no Brasil
As mudanças climáticas são uma realidade incontestável e já transformam setores essenciais da economia global. No Brasil, cuja matriz energética é amplamente renovável, a variabilidade climática representa um desafio crescente para a geração de energia hídrica, solar e eólica. Eventos como secas prolongadas, tempestades intensas e mudanças bruscas nos padrões de irradiação solar e velocidade dos ventos impactam diretamente a eficiência e a previsibilidade das usinas.
A geração hidrelétrica, que historicamente desempenha um papel fundamental no suprimento energético do país, enfrenta períodos críticos de estiagem que reduzem os níveis dos reservatórios e exigem maior acionamento de termelétricas elevando custos e emissões de carbono. Da mesma forma, a energia solar e eólica sofrem com oscilações imprevisíveis que afetam a estabilidade do sistema elétrico.
A crescente incerteza na geração de energia impõe riscos financeiros e operacionais significativos, tornando essencial a adoção de novas tecnologias para otimizar a gestão desses recursos. Nesse cenário, a Inteligência Artificial (IA) surge como uma aliada poderosa, permitindo previsões climáticas mais precisas, ajuste dinâmico na operação das usinas e melhor integração entre diferentes fontes energéticas.
Neste artigo, exploraremos:
1. O impacto da variabilidade climática na geração solar e eólica, destacando os principais desafios do setor.
2. Como a IA pode prever e mitigar esses efeitos por meio de tecnologias como digital twins e análise de dados em tempo real.
3. O futuro da energia renovável no Brasil e como a IA pode tornar o setor mais sustentável.
A variabilidade climática e seus desafios para o setor energético
A imprevisibilidade climática afeta diretamente a eficiência das usinas solares e eólicas, tornando a geração de energia menos estável e mais desafiadora de gerenciar. Aqui estão os principais impactos para cada tipo de usina:
Usinas Solares
A geração de energia fotovoltaica é projetada com base em dados históricos de irradiação solar, temperatura e outras variáveis climáticas da região. No entanto, com as mudanças climáticas, esses padrões podem se alterar, causando impactos inesperados na eficiência das usinas.
Mudanças inesperadas na temperatura
Durante o projeto de uma usina solar, utiliza-se o histórico climático para dimensionar corretamente os equipamentos. Se um ano apresentar temperaturas significativamente mais altas do que o previsto, diversos problemas podem surgir:
✔ Queda na eficiência dos módulos – O calor excessivo reduz a capacidade de conversão da luz solar em eletricidade, diminuindo a geração de energia.
✔ Sobrecarga de inversores – O aumento inesperado da temperatura pode levar a tensões mais altas nos inversores, o que pode causar desligamentos frequentes, redução na vida útil dos componentes ou até mesmo danos permanentes.
✔ Desgaste prematuro dos cabos e conexões – O aquecimento excessivo pode afetar a isolação dos cabos, aumentando o risco de falhas elétricas.
✔ Distorção no planejamento da geração – Como a produção de energia foi projetada com base em um cenário climático passado, pode-se apresentar desligamentos inesperados, ocasionando queda significativa de geração. Um aumento inesperado na temperatura pode comprometer as projeções de retorno financeiro e o cumprimento de contratos de fornecimento de energia.
Acúmulo de sujeira em temperaturas extremas
Em regiões mais secas, onde chuvas regulares ajudariam a limpar os painéis solares, temperaturas muito altas podem fazer com que a sujeira e poeira sequem e se acumulem, formando uma camada que reduz significativamente a geração de energia. Se essa condição extrema não foi prevista no projeto original da usina, a queda na geração pode passar despercebida por um tempo, a menos que análises detalhadas sejam feitas regularmente.
Usinas Eólicas
A geração de energia eólica depende da força e constância dos ventos. A imprevisibilidade climática afeta sua eficiência pelos seguintes fatores:
Mudança na intensidade dos ventos
Se os ventos forem muito fracos, as turbinas podem não gerar energia suficiente. Por outro lado, ventos muito fortes ou rajadas repentinas podem forçar o desligamento das turbinas para evitar danos.
Variação na direção dos ventos
Turbinas eólicas são projetadas para operar dentro de uma faixa específica de direção do vento. Se os ventos mudam constantemente de direção, a eficiência da conversão de energia diminui.
Eventos climáticos extremos
Furacões, tempestades e ciclones podem causar danos estruturais às turbinas, exigindo manutenções corretivas e períodos de inatividade.
Consequências para o Setor Energético
A imprevisibilidade climática gera desafios na gestão do fornecimento de energia, especialmente porque fontes renováveis não possuem armazenamento natural, como ocorre em hidrelétricas com reservatórios. Isso pode resultar em:
⚡ Oscilações na rede elétrica, exigindo complementação por fontes térmicas, que são mais caras e poluentes.
⚡ Dificuldade no planejamento da geração e distribuição, aumentando a necessidade de investimentos em soluções de armazenamento, como baterias.
⚡ Redução da confiabilidade do sistema, impactando o custo da energia e a segurança do fornecimento.
Para compreender melhor a magnitude desse desafio, é essencial olhar para dados concretos sobre como mudanças no clima já estão afetando a geração de energia no Brasil e no mundo. Estudos recentes apontam que eventos climáticos extremos estão tornando a geração renovável mais volátil, trazendo riscos financeiros e operacionais para o setor.
🔹 Perdas em Usinas Solares: Segundo o NREL (National Renewable Energy Laboratory), a formação repentina de nuvens pode reduzir a geração de energia solar em até 80% em poucos minutos. No Nordeste brasileiro, onde a variabilidade climática é alta, essas oscilações resultam em perdas médias entre 10% e 20% ao ano. Um exemplo prático ocorreu em 2021, no Ceará, quando uma usina solar registrou uma queda de 15% na geração durante um período de tempestades intensas.
🔹 Impactos nas Usinas Eólicas: Dados da BloombergNEF indicam que mudanças nos padrões de vento podem reduzir a eficiência das usinas eólicas em até 30% durante períodos de calmaria prolongada. Em 2022, no Rio Grande do Norte, usinas eólicas enfrentaram perdas de 25% devido a ventos fracos, exigindo o acionamento de termelétricas para suprir a demanda.
🔹 Secas e o Impacto nas Hidrelétricas: A crise hídrica entre 2020 e 2021 reduziu drasticamente os reservatórios das hidrelétricas brasileiras, levando a uma queda de 30% na geração em algumas regiões e um aumento de 40% no uso de termelétricas, elevando custos e emissões de carbono. A usina de Furnas, no Sudeste, registrou uma redução de 35% na geração no período.
🔹 Curtailment e Desperdício de Energia: De acordo com a IRENA, em 2022, mais de 1.000 GWh de energia eólica e solar foram desperdiçados no Brasil devido a limitações na transmissão e falta de armazenamento. No Nordeste, o curtailment atingiu picos de 15%, gerando prejuízos milionários.
Projeções para o Futuro
Segundo a IEA, se nenhuma ação for tomada, as perdas de geração renovável devido a eventos climáticos extremos podem crescer até 25% até 2030. Estudos do IPEA alertam que, sem investimentos em armazenamento e redes inteligentes, o Brasil pode enfrentar desafios ainda maiores nos próximos anos.
Esses números deixam claro que a variabilidade climática já está impactando significativamente a geração de energia. Mas como podemos mitigar esses efeitos e garantir maior previsibilidade e eficiência? A resposta pode estar no uso de Inteligência Artificial.
A Inteligência Artificial como solução
Nesse cenário, a Inteligência Artificial (IA) surge como uma ferramenta poderosa para prever padrões climáticos, simular cenários e ajustar a geração de energia em tempo real, garantindo maior eficiência e rentabilidade. Ao combinar dados históricos, modelos meteorológicos avançados e informações em tempo real, a IA pode prever padrões climáticos com maior precisão do que métodos tradicionais. Algoritmos de aprendizado de máquina analisam milhares de variáveis, permitindo antecipar fenômenos como:
Oscilações na irradiação solar e variações na temperatura;
Mudanças nos padrões de vento que impactam a geração eólica;
Tendências de seca que podem afetar reservatórios hidrelétricos.
Com previsões mais precisas, operadores podem tomar decisões proativas, reduzindo perdas e garantindo maior estabilidade no fornecimento de energia. Além disso, a utilização de Digital Twins pode trazer cenários climáticos em tempo real. Os gêmeos digitais (Digital Twins) são modelos virtuais que replicam o comportamento das usinas em tempo real. Essas tecnologias utilizam IA para testar diferentes cenários climáticos e identificar estratégias para otimizar a operação. Na prática, isso significa:
Ajustar automaticamente a inclinação dos painéis solares para maximizar a captação de energia em dias nublados;
Controlar a velocidade das turbinas eólicas para evitar sobrecargas ou subutilização;
Simular impactos de secas em hidrelétricas e planejar o despacho energético de forma mais eficiente
Essas análises reduzem custos operacionais e aumentam a resiliência das usinas diante da variabilidade climática. Além de prever e simular cenários, a IA também permite otimizar a operação das usinas mesmo em condições adversas. Entre os benefícios, destacam-se:
Redução de perdas: Ajuste automático dos inversores solares para evitar sobrecargas ou falhas devido a altas temperaturas inesperadas;
Manutenção preditiva: Sensores alimentados por IA identificam falhas antes que elas ocorram, prevenindo danos e otimizando a vida útil dos equipamentos;
Gestão inteligente do despacho energético: Integração entre fontes renováveis (solar, eólica e hídrica) para equilibrar a geração e evitar desperdícios.
Com essas inovações, a IA transforma desafios climáticos em oportunidades, tornando a matriz energética mais segura, eficiente e sustentável.
O Futuro: IA e Sustentabilidade
À medida que a matriz energética global caminha para uma transição mais sustentável, a Inteligência Artificial se torna uma ferramenta essencial para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas. O setor de energia renovável precisa não apenas expandir sua capacidade instalada, mas também tornar a geração mais previsível, eficiente e resiliente diante de cenários climáticos cada vez mais incertos.
Tecnologias baseadas em IA permitem que as usinas renováveis operem de maneira mais inteligente, reduzindo desperdícios e otimizando o uso dos recursos naturais disponíveis. Modelos preditivos, manutenção baseada em condição e digital twins garantem que cada unidade de energia gerada seja aproveitada ao máximo. Com a capacidade de prever oscilações na geração e otimizar o despacho de energia, a IA pode reduzir a dependência de fontes fósseis em momentos críticos, ajudando o Brasil a atingir suas metas de descarbonização e ampliação da participação das energias renováveis na matriz elétrica.
A transição para uma economia de baixo carbono e a adoção de energias renováveis exigem uma colaboração estreita entre empresas, governos e instituições de pesquisa. Para que o potencial da IA nas energias renováveis seja plenamente aproveitado, é essencial que haja uma sinergia entre os setores público e privado.
Ainda para que a IA alcance seu máximo potencial, é necessário investir em infraestrutura digital, redes inteligentes e sistemas de armazenamento. Apenas com uma rede robusta e dados precisos a IA pode tomar decisões assertivas para garantir maior segurança energética. A união entre tecnologia e sustentabilidade não é mais uma tendência, mas uma necessidade. Países e empresas que liderarem essa transformação terão vantagens competitivas no futuro da energia limpa.
Conclusão
“As soluções tradicionais, baseadas apenas em planejamento histórico e reações corretivas, não são mais suficientes para garantir a resiliência do sistema energético.“
A variabilidade climática já impacta a geração de energia renovável de forma significativa, trazendo desafios técnicos, financeiros e operacionais para o setor.
A Inteligência Artificial surge como um diferencial estratégico, permitindo que usinas solares, eólicas e hidrelétricas operem de forma mais eficiente e previsível, reduzindo riscos e maximizando a geração. Modelos preditivos, digital twins e manutenção inteligente são apenas algumas das inovações que podem transformar a forma como gerenciamos a energia renovável.
O momento de agir é agora. Para garantir um futuro energético sustentável e competitivo, empresas do setor precisam investir em tecnologia e adotar soluções baseadas em dados. Além disso, políticas públicas podem acelerar a digitalização da matriz elétrica, garantindo um sistema mais estável e sustentável para os próximos anos.
E você? Sua empresa já está preparada para essa transformação? Como a IA pode ajudar a sua operação a lidar com os desafios climáticos? Compartilhe sua visão nos comentários e vamos construir juntos o futuro da energia!
Sobre a Autora
📢 Telma Meneghette Bassan é executiva no setor de energias renováveis, com mais de 10 anos de experiência no setor fotovoltaico. Liderou a introdução da tecnologia de Digital Twins em parceria com a empresa canadense Quadrical.AI. Possui graduação em Engenharia Elétrica, especialização em Energias Renováveis e mestrado em Sistemas de Energia. Atua no desenvolvimento de soluções para otimizar a eficiência e previsibilidade na geração renovável.
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